Ouviram-se gritos alados
Que vieram de lugar nenhum.
Olharam as bússolas e os mapas...
Quebradas, rasgados...
Destruíram o mundo!
Pois o mundo é frequentemente
Gritado
Resumido
Em um objeto pequeno,
Em desenhos de cores.
E eu não tenho nada contra os objetos pequenos
- Pois eu o sou bem sido.
E não tenho nada contra as cores dos desenhos
- Pois sem elas de nada nos vale a dolorosa e quente infância
Mas estou dizendo
Que os objetos pequenos e as cores dos mapas
Receberam tinta humanas
Então, se destruíram.
O grito é alado,
Mas entenda: do chão não quer sair.
As bússolas quebradas,
As recebemos nas escolas, nos empregos, nos impostos.
Fazem-nos olhar para o lugar errado,
E nos convencem a ir lá.
Os mapas rasgados são os que desconstroem o nosso caminho
Aquele caminho traçado por uma mente de criança,
O que fora imaginado por uma menina ou um menino
Enquanto brincavam de pega-pega ao ar livre.
Mas o ar fora condicionado,
Impresso em folhas de jornais silvestres
Cujas letras transportam o supérfluo ao entendível
E o entendível ao supérfluo.
Pois quem se importa em correr na grama?
Sujar-se na lama?
Querem as sujeiras somente se estas forem feitas
De concreto massudo.
Ninguém quer arranhar-se na areia molhada
Por ter medo da raiva do mar.
Aliás, é um pouco disso:
Esse medo tolo que faz nossos joelhos sangrarem.
E há ainda os relógios de cozinha
Que fazem de dois ponteiros
Os donos do tempo.
Se nem o grito é nosso,
E nem ele quer voar...
Porque então ainda se mede o tempo?
Para saber por quantas horas nos condicionamos à nossa vida de nada?
Ou para calcular quanto tempo de sermos nada ainda temos?
Pior: Esses ponteiros trabalham
Para que possamos acreditar que a bússola e o mapa
Não estão mais entre nós...
Acreditar que já são coisas engolidas pelo próprio tempo.
Engana-se, porém, aquele cujas ideias aceitam isso friamente.
O mapa nosso resumiu-se a um roteiro cíclico e sem fim
E nossa bússola perdeu seu Norte,
Anda, roda e vira, igualmente em todos os Pólos.
E nós,
Donos da razão e da verdade,
Achamos que o mundo evolui a cada era.
CLARISSA DAMASCENO MELO
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