Meu oco
É o velho
Não tilintar de voz.
Ou muda o mundo,
Ou eu morro à sós.
CLARISSA DAMASCENO MELO
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domingo, 28 de abril de 2013
Atravessar a rua II
Segure meu braço
E deixe que minhas mãos
Se apoiem em seus ombros.
Esqueci como é que se faz
Para atravessar a rua
Sozinha.
CLARISSA DAMASCENO MELO
E deixe que minhas mãos
Se apoiem em seus ombros.
Esqueci como é que se faz
Para atravessar a rua
Sozinha.
CLARISSA DAMASCENO MELO
sábado, 27 de abril de 2013
Decreto.
Decreto o final da poesia saudosista,
Da poesia doente,
E que seus poetas morram!
Decreto o fim da bestialidade humana
Mas que todo ser humano besta
Sobreviva.
Decreto que o próximo seja amado
Mas não mais que amado
Que o umbigo.
Mas que todo umbigo
Continue sendo menor
Do tamanho que já é.
Decreto que as meninas
Cubram suas bocas
Com balas de café
E que os meninos
Aceitem balas de café
Chupadas
E que palavras nossas
Sejam palavras nossas.
Decreto que ninguém deve sentir
Como se não pudesse sentir
E que sinta como achar
Que o sentir lhe faz sentido,
Sem que seu sentido seja marcha de palhaço.
Decreto o fim das linhas
Que se entortam e
Morrem.
Decreto, aliás,
Minha imortalidade.
Quem nasceu para escrever
Não morre.
Decreto que o teto
De todos os quartos
De todas as crianças,
Seja azul.
Seja azul para que
Todas as crianças de
Todos os quartos
Possam, ainda, acreditar
Que existe azul no Céu
Embora uma escala cinza lhe seja erguida
Em olhos.
Decreto o fim - para sempre -
Daquelas palavras
Que não foram ouvidas.
Decreto que não haja
Uma forma sequer de sussurro.
Palavras foram feitas
Para que alguém
As grite!
Decreto o fim
Dos dilemas caóticos
Do povo sem coração.
Decreto morte
Aos sentimentos maus.
E vida, decreto vida,
Àqueles que nos fazem
Sonhar à noite.
E, no mais,
Decreto que meus decretos
Não sejam leis - estas não servem,
Estas são feias.
E se meu decreto for lido
Em alta voz,
Que seja lido
Por uma criança
Que acredita em fadas.
Decreto final:
Nenhuma palavra deve machucar.
CLARISSA DAMASCENO MELO
Da poesia doente,
E que seus poetas morram!
Decreto o fim da bestialidade humana
Mas que todo ser humano besta
Sobreviva.
Decreto que o próximo seja amado
Mas não mais que amado
Que o umbigo.
Mas que todo umbigo
Continue sendo menor
Do tamanho que já é.
Decreto que as meninas
Cubram suas bocas
Com balas de café
E que os meninos
Aceitem balas de café
Chupadas
E que palavras nossas
Sejam palavras nossas.
Decreto que ninguém deve sentir
Como se não pudesse sentir
E que sinta como achar
Que o sentir lhe faz sentido,
Sem que seu sentido seja marcha de palhaço.
Decreto o fim das linhas
Que se entortam e
Morrem.
Decreto, aliás,
Minha imortalidade.
Quem nasceu para escrever
Não morre.
Decreto que o teto
De todos os quartos
De todas as crianças,
Seja azul.
Seja azul para que
Todas as crianças de
Todos os quartos
Possam, ainda, acreditar
Que existe azul no Céu
Embora uma escala cinza lhe seja erguida
Em olhos.
Decreto o fim - para sempre -
Daquelas palavras
Que não foram ouvidas.
Decreto que não haja
Uma forma sequer de sussurro.
Palavras foram feitas
Para que alguém
As grite!
Decreto o fim
Dos dilemas caóticos
Do povo sem coração.
Decreto morte
Aos sentimentos maus.
E vida, decreto vida,
Àqueles que nos fazem
Sonhar à noite.
E, no mais,
Decreto que meus decretos
Não sejam leis - estas não servem,
Estas são feias.
E se meu decreto for lido
Em alta voz,
Que seja lido
Por uma criança
Que acredita em fadas.
Decreto final:
Nenhuma palavra deve machucar.
CLARISSA DAMASCENO MELO
Esquina.
Na esquina,
Um senhor fechava a loja de brinquedos
Uma criança enfiava dedos na boca
Uma mulher, carregava um filho
Um filho, carregava uma mãe.
Na esquina,
Ali, na beirada da rua,
Uma menina fugia de casa,
Uma senhora gritava,
E ninguém olhou para trás.
Na esquina,
Mascaram uma bala de goma
Engoliram saliva doce
Artificial.
Na esquina,
Um cão fora atropelado
E uma mão de menina correu o rosto
Que chorava.
A esquina abrigava o mundo,
Mas todo mundo acaba.
CLARISSA DAMASCENO MELO
Um senhor fechava a loja de brinquedos
Uma criança enfiava dedos na boca
Uma mulher, carregava um filho
Um filho, carregava uma mãe.
Na esquina,
Ali, na beirada da rua,
Uma menina fugia de casa,
Uma senhora gritava,
E ninguém olhou para trás.
Na esquina,
Mascaram uma bala de goma
Engoliram saliva doce
Artificial.
Na esquina,
Um cão fora atropelado
E uma mão de menina correu o rosto
Que chorava.
A esquina abrigava o mundo,
Mas todo mundo acaba.
CLARISSA DAMASCENO MELO
Moleque sujo.
Chovia.
A noite começara pelo canto de tua boca e escorregou, inerte, por ali, pelas beiradas. A noite era líquida, bebível e escura. Quantas horas se passaram desde que ela aprendera a beber a noite? Não fazia ideia. Não esperou que lhe chamassem para dormir, estava esquecida. No canto da boca, por onde a noite passara, umas poucas palavras escorregavam escapulentas. Junto às palavras, gotículas de olhos, salgadas, morrendo ali. Já não sabia se era a chuva curvulenta de seus neologismos próprios, ou se era a água salgada que escorria à noite, sempre à noite, quando ia se deitar e lembrava do passado.
Cuidado com o passado.
Ele é um moleque sujo
Que vem nos agarrar de vez em quando.
CLARISSA DAMASCENO MELO
sexta-feira, 12 de abril de 2013
Fugiu.
A inspiração foge
E deixa, no lugar,
Um pano translúcido
Que não sabe
Mostrar nada.
CLARISSA DAMASCENO MELO
E deixa, no lugar,
Um pano translúcido
Que não sabe
Mostrar nada.
CLARISSA DAMASCENO MELO
quarta-feira, 3 de abril de 2013
Filho-de-rua.
Ninguém viu,
Mas virou a esquina,
Sobre pés descalços,
Um menino filho-de-rua.
CLARISSA DAMASCENO MELO
segunda-feira, 1 de abril de 2013
Se é noite.
A
noite, quanto mais escura, quanto mais profunda, quanto mais noite seja; me é
capaz de absorver, lento-absurdamente, em seu viés criativo-produtivo. Não, não
digo, pois, que escrevo meu escrever em noites e somente em noites; mas o sabor
turvo da escuridão faz-me parecer menos eu e mais meu ego violento que em mim
habita e não se mostra. Sem pieguice, a noite traz conforto extra às palavras
tais quais estas, que de tão desconfortáveis e confusas, mais parecem
justificativa que qualquer outra coisa.
É
noite, das que as estrelas, de tão cansadas por estarem onde estão, fazem-se
tímidas por detrás das nuvens. Nem mesmo os grilos, nem as rãs, nem os
bichos-noite, são capazes de, lá fora, me fazerem acreditar que ali eles estão.
Nem eu, nessa noite, estou querendo fazer de minha existência, fato concreto.
Eis o motivo tal que faz as palavras que vos descrevo serem singelas de todo
seu modo. Não há agonias em minhas palavras, nem encruzilhadas sem respostas.
Há somente palavras.
Acusaram-me
de labirintar minhas informações. Defendo-me: Não as labirinto; as edifico em
diagonal. Há defeito meu, confesso, no ato próprio do contar história; as horas
antes que se passam antes do começar a acontecer. Peço desculpas pelos grãos de
desaprovação que planto logo no início de cada texto e justifico-me: não sei,
diferente, fazer. E se te evoco, leitor, é, pois, que eu te quero atento.
Dialogue comigo quando fores me conhecer. Ando livre de tempo e necessitada de
prosear além das cruas vias conhecidas.
A
noite, lá fora, é noite doida-escura dos sem o que fazer. Noite que parece
calda quente, jogada em lentas curvas num lençol, ora azul, ora ela própria. Há
algo nela que me põe, inquieta, a comparar-me eu e ela. O silêncio que
incomoda. O abismo que incomoda. A incógnita que incomoda. A solidão tão sólida
quanto gelo bruto que se bota a derreter, vez por outra, por praticidade ou
ação exterior. Nenhum superlativo para nós. Somos, como dizem e digo, eu,
agora, coisa de um mesmo fundo poço.
Lá
fora, leitor, o silêncio é tão concreto e tão concreto é a ponto de deixar,
aqui por dentro, para nós, iscas tais que uso na pesca de inspirações perdidas.
No leve estranhar de mim, lembranças. O vento que ecoa e vibra faz com que eu me
lembre das vibrações internas e incontroláveis, sem com que, no entanto, me
afete exteriormente. Faz com que eu me lembre, dentre todas as outras coisas
que também me lembro, a intransitividade das vibrações tais quais esta que
sinto no simples fato do lembrar.
E,
não somente o vento, mas o borbulhar de folhas que se encrespam em si mesmas, a
festa do barulho-líquido que escuto, aqui de dentro, a quebrar o silêncio
doloroso para, em troca, presentear a natureza com barulho miúdo que, de tão
desconfortável, torna-se essencial. Até o cair de folhas é incômodo bruto e,
logo mais, torna-se música. Um pequeno tilintar anti-romântico de festas sobre
coisas que caem. Folhas caem. Chuva cai. Estrela cai. E, se tu duvidas, não
duvide; vez por outra, pessoas caem também.
Meu
fervilhar de consciência, pseudo-adormecido durante o dia, à noite, é capaz de
fazer-me coisas absurdamente tristes, absurdamente alegres. Essa bipolaridade,
no entanto, bifurca consequências que, em suma, dão-se ao mesmo tempo e sem
diagonais, solidamente a fazerem-me inteira. Não serão, julgueis agora, o
resultado primordial? Essa quimera que nos completa não é, senão, lado dia e
lado noite? O que estou querendo dizer, no entanto, é que meu lado noite é
composto ainda por outras tantas quimeras bipolares que, no fim, nem mesmo sei
por quantas partes me construíram.
Por
algum motivo, a noite cai. E que, nesse momento, os físico-químico-biólogos
fiquem permanentemente em silêncio. Não quero ciência capaz de me explicar a
frequência noturna da escuridão. Só quero entender a noite de forma
poético-lírica. Se eu disser que a escuridão é fruto de pedido meu para treinar
minhas vistas quando dia for, por favor, cientistas, silenciem. A noite cai
porque, dentro de todos os outros fatores, existe um pedido meu. Caia noite,
dê-me vida.
Quando
é dia, e me ponho a caminhar pelas ruas de qualquer cidade, vejo coisas que, se
fosse noite, eu não veria. Um menino de boca aberta me pede moeda e não as
tenho... Perceba que, se fosse noite, eu não o veria. Quando é dia, eu vejo
prédios diante de mim e, no entanto, não vejo o que eles escondem atrás de todo
o cimento; se fosse noite, a culpa seria dela. Caminho dentro dos carros
engarrafados e me atraso diante de um fator que foi criado para não me fazer
atrasada. Se fosse noite, e agora eu me sinto exausta e crua, eu caminharia
fora dos carros e ainda me sentiria dentro deles; no entanto, seria noite e
acabo aqui minhas reclamações.
A
noite, leitor, me serve para me fazer criar desculpas grandes. Desculpai-me
pelo meu silêncio sólido. Desculpai-me pelas palavras enérgico-amargas.
Desculpai-me pelo desprazer de me vestir de mim logo cedo de manhã, mas, no
entanto, fazer-me outra aparecer, outras, que também me sou. Desculpai os
grandes períodos, os grandes parágrafos. Minha falta de técnica é, talvez,
maior que minha necessidade de escrever.
E
se minhas desculpas pareceram-lhe poucas ou frias ou escassas de tudo, perdoai,
também. Ultimamente, tenho sonhado o dobro. Mas, à noite, o sonho me vem
encrespado com o conforto que nem sequer é meu. Imagineis: eu, pobre de juízo,
deitada por sobre caldo quente, a imaginar os dias depois destes que me
invadem! Que loucura! Se me embargo a sonhar, agora, entenda, é o fator-noite
agindo em mim.
Certa
vez, vou lhes contar com precisão, em uma aula qualquer, pediram-me para
escrever um parágrafo. A estranheza desse fato é por ele pertencer a um tempo
outrora sonhado que, agora, por ser sólido-carne, não tem tanta importância.
Escrevi e achei o parágrafo o mais bonito do mundo. Muitas letras; meus verbos,
conjugados em amor maior, choviam e faiscavam. Mas eis que disseram dele coisas
que me encresparam o rosto. Meu júbilo era fracassado, então, eu também o era.
Em
contra ponto, noites e mais noites antes desse fato, quando o fato desse fato
ainda era um fato a ser sonhado em outros fatos, eu escrevi outro parágrafo sem
que me pedissem. Era horroroso: muita técnica, pouca liberdade. Meus verbos não
eram meus, nem tampouco, as vogais maiúsculo-minúsculas. Sossegue:
abrilhantaram-no. Concluí, agora, porque me embaraço a dizer de minha técnica?
Fato é que, durante o dia, só sirvo se eu estiver condicionada a outros tempos.
Só faço questão de me ser, no entanto, quando e por quanto eu for julgada para
baixo. Só eu sei a resposta.
A
noite é a resposta: ela é quem me faz o labutar mais doce-quente. Sem ela,
talvez, eu me dedicasse a ver e sentir outras coisas subjacentes e
deselegantes. Talvez eu me enfiasse em livros técnicos demais, ou me fizesse
nula diante de pensamentos meus. O dia é cheio demais e eu não caibo por dentro
dele. Ele me excomungou no dia mesmo em que resolvi nascer à noite. Veja você:
e ainda dizem que a noite é traiçoeira!
Durante
o dia, eu saio às ruas vestida de trajes limpos e escassos, passo pelas
esquinas em que, à noite, trabalham elas que não usam roupas. Quando é dia. Eu
vejo a bala atravessar a garganta do bandido-morto. Por quanto mais a luz
brilha seu brilhar diante da terra, eu vejo crianças sendo enxotadas de suas
casas para irem trabalhar à força, eu vejo mulheres apanhando, eu vejo a
escassez de água, eu vejo o descaso, eu vejo meus vejos e vejo a omissão.
Sinto-me no dever de, quando ser noite, cuspir pra fora todo o escopo absorvido
à luz do dia. Queridos, a noite é minha justiça. Sem ela, não há prazer.
CLARISSA
DAMASCENO MELO
Coisa de olho sem brilho.
Se me perguntarem o motivo de minha tristeza, talvez eu responda assim:
- Os olhos, os olhos perderam o brilho.
CLARISSA DAMASCENO MELO
- Os olhos, os olhos perderam o brilho.
CLARISSA DAMASCENO MELO
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