Eu vejo um rosto.
No final da escada,
No meio do corredor,
Na praça lotada,
No elevador...
Em um texto,
Em um remendo,
Em um papel em branco,
No centro.
Eu vejo um rosto.
O rosto não me vê.
Vejo dentro de um ônibus,
Partindo...
Em uma bicicleta,
Em um inalador,
Em remédios redondos,
Em um copo d'água.
Vejo um rosto na água parada,
E na lágrima que goteja a goteira
Do Céu.
Chove, Céu.
Traga chuva pra chover.
Traga a água pra beber,
Chove, Céu.
Só não chove aqui
Onde eu vejo um rosto
E o rosto não me vê.
A face pontiaguda,
Cheia de curvas invisíveis,
Uma língua cheia de palavras,
Palavras mudas,
Sem som.
Eu escuto as palavras desse rosto.
Elas dizem o que eu já decorei.
Uma piscina,
Um verão,
Uma cidade...
Esse rosto me faz
Abrir feridas.
Não há tempo.
Eu vejo o rosto jogado no tempo
Caminhando sem pés,
Pelos braços fortes,
Pela língua muda.
Eu vejo o rosto
Nas nuvens,
Dentro de uma bacia com água e gelo,
Em um banheiro vazio,
Em um medo.
O rosto está espalhado na cidade,
Grita,
Chuta,
Uiva.
Em todos os lugares,
Em todas as cabeças,
Em todas as esquinas.
Mas
Não
Há
Rostos no espelho.
CLARISSA DAMASCENO MELO
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