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sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Sobre a criação do mar.


Num pedaço de concreto,
Deságuo meus nós,
Meus embaraços,
Minha timidez.

O carbono faz
Com que minha pele queime,
Com que meus dentes
Desistam de mastigar.

Minha boca quer comida mastigada.

Eu mastigo o vento
E a poeira cinzenta
Que voa por ele.

Eu respiro coisas que matam.

Adeus, mundo verde!
Estamos na Era do Metrô.

Metrô eu,
Metrô você,
Metrô de gente cinza.

Carbonizaram a paisagem.

Adoram açúcar,
O doce eletrônico.

Enchem-se de açúcar industrial
Usam fantasia de cetim no Carnaval.

Adoçam o café,
Os refrigerantes,
Os sucos em pó...
Esquece-se de adoçar a vida.

A vida segue supracitada.

Viver requer barro,
Água,
Sal.

Não há verde no quintal.

Eu quero mais,
Eu quero mais
Poeira.

Alô, alô, vida nova!
Vida nossa,
Salgada com lágrimas que secam.

O rio ficou seco,
O povo ficou seco,
A lágrima secou
E não lavou nenhuma alma.

Oh!
E eu que pensei ser o fim,
Que pensei ver o mundo se destruir,
Eu que pensei nas águas
Desaguadas pelos olhos,
Olhos claros do mar...

Pensei que juntar todos os choros,
De crianças famintas,
De mulheres doídas,
De homens em trapos,
De doentes mentais...

Pensei que juntar
Todas as dores,
N’um pacote plástico
E amarrar com arame...

Fosse criar um mar.
Não cria?

Colocar essa gente para chorar...
Talvez se fosse um mar
Um mar de coisa
Bota essa gente na coisa,
Faz essa gente nadar...

Joga essa gente no mar,
Deixa o mar levar
Deixa o mar lavar
Deixa o mar afogar.

Eis uma saída:
Mergulhar nas lágrimas.

CLARISSA DAMASCENO MELO

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