Ela disse:
- Você tem essa mania besta de não me responder!
Calmo, respondeu:
- E você, essa mania besta de querer palavras. Não as queira quando tudo o que eu puder ter for um olhar.
- Mas seus olhos são frios.
- Eu sei.
- E então?
- Ainda que frios, eles apontam para você. Não estás satisfeita?
Silêncio.
Ele disse:
- Já reparou como um único ponto de luz, ainda que fraco, ilumina parte de um quarto escuro?
- Não entendi.
- Ainda que meus olhos sejam frios, você gosta deles?
- Sim.
- Então estás iluminada.
Silêncio.
Ela disse:
- Vamos dormir.
- Faça silêncio. A luz do dia não pode se assustar.
- Dormir com você é sentir medo de retaliações?
- Dormir comigo é dormir só.
Ele disse:
- Essa fábrica... sua sirene me fere.
- A sirene é alta?
- Ainda que seu ruído fosse baixo, incomodaria.
Ela disse:
- Vamos viajar.
- Para onde?
- Por aí...
Ele disse:
- Preciso beber café.
- Eu também.
- Não quero ir fazer.
- Por que?
- Não tenho pressa.
Ela disse:
- Admiro você.
- Não faça isso.
- Por que?
- Biografias. Ou apelam ou desapontam.
- Mas não quero saber sua biografia. Quero saber quem é você agora.
Ele disse:
- Suicídio é covardia.
- Não, é coragem.
- É triste o desespero. Não suportar a tristeza não é coragem, é covardia.
Ela disse:
- Por que falamos de suicídio?
- Anorexia existencial.
Silêncio.
Ele disse:
- A existência é uma garota doente.
- Não entendi.
- Não precisaria.
Ela disse:
- Conversar é estranho.
- Não entendi.
- Não precisaria....
Clarissa Damasceno Melo
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