Páginas

sábado, 27 de abril de 2013

Decreto.

Decreto o final da poesia saudosista,
Da poesia doente,
E que seus poetas morram!

Decreto o fim da bestialidade humana
Mas que todo ser humano besta
Sobreviva.

Decreto que o próximo seja amado
Mas não mais que amado
Que o umbigo.

Mas que todo umbigo
Continue sendo menor
Do tamanho que já é.

Decreto que as meninas
Cubram suas bocas
Com balas de café

E que os meninos
Aceitem balas de café
Chupadas

E que palavras nossas
Sejam palavras nossas.

Decreto que ninguém deve sentir
Como se não pudesse sentir

E que sinta como achar
Que o sentir lhe faz sentido,
Sem que seu sentido seja marcha de palhaço.

Decreto o fim das linhas
Que se entortam e
Morrem.

Decreto, aliás,
Minha imortalidade.

Quem nasceu para escrever
Não morre.

Decreto que o teto
De todos os quartos
De todas as crianças,

Seja azul.

Seja azul para que
Todas as crianças de
Todos os quartos

Possam, ainda, acreditar
Que existe azul no Céu
Embora uma escala cinza lhe seja erguida
Em olhos.

Decreto o fim - para sempre -
Daquelas palavras
Que não foram ouvidas.

Decreto que não haja
Uma forma sequer de sussurro.

Palavras foram feitas
Para que alguém
As grite!

Decreto o fim
Dos dilemas caóticos
Do povo sem coração.

Decreto morte
Aos sentimentos maus.

E vida, decreto vida,
Àqueles que nos fazem
Sonhar à noite.

E, no mais,
Decreto que meus decretos
Não sejam leis - estas não servem,
Estas são feias.

E se meu decreto for lido
Em alta voz,
Que seja lido
Por uma criança
Que acredita em fadas.

Decreto final:
Nenhuma palavra deve machucar.

CLARISSA DAMASCENO MELO

Um comentário: