Eis que, no tardar da hora, respiro fundo na tentativa frustrada de esquecer uma
certa dor que aparece aguda não somente em mim, mas em toda uma legião de alunos
fascinados por um professor. Alegres, por um dia terem compartilhado a voz rouca
e a alegria contagiante, inconsolados, por terem perdido uma personalidade tão
brilhante quanto notada. E este é o típico dia que eu desejaria fortemente não
existir. Mas existe e é todo nosso.
Eu escreveria, se pudesse, um texto para
transcrever e traduzir o que não costuma ter tradução: O amor incondicional
pelos alunos que, inclusive, por ser recíproco, me coloca a tentar escrever. Mas
quando escrevo, surge a teimosia. Por que sei, bem sabido, que jamais será
possível traduzir em letras todo um amor que é meu e de todo mundo. Todo um
tempo que se foi sem fazer despedida nem hora em nossa porta. Foi assim, de
supetão, tudo.
Eu poderia escrever sobre isso. Sobre o amor que a gente
sente. Mas, o sentir amor está bem mais relacionado a se agarrar fortemente em
algo ou alguém. Agarramos-nos a Rafael Mendes; porém, condiz mais dizer porque.
E... digam-me: Por quê? Será o senso moralista passado em todas as aulas? Ou o
típico baianês exaltado? Será, ainda, as performances musicais...? As duras
críticas contra a politicagem corrupta e desumana... as injustiças sociais... O
desapego nosso pelo lugar em que vivemos? Será o gingado que o mantinha de pé
até mesmo na hora de proferir um palavrão? Será o jeito de nos fazer rir? Ou,
será ainda, uma reunião disso tudo adicionado a um “mais” subentendido e
resguardado?
Foi-se um tempo não só de admiração, mas de devoção mesmo. Ele
entrava na sala e todas as luzes se apagavam. Parecia que ele próprio era a luz
que refletia no quadro. Era aula dele por si próprio. E, sabemos todos, ele
brilhava sem fazer força.Dava aula olhando nos olhos. Parecia ter certeza de que
era amado. Não será sua partida suficiente para nos fazer esquecer daquilo que
foi belo. E será belo para sempre.
O tempo vai passar, e, o que ficará,
dentre todas as coisas que importam, é o sorriso sincero, o batuque baiano e a
vontade de ver as coisas melhorarem.
Clarissa Damasceno Melo
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